Pinctura por pictura

15.12.21 Rui Veríssimo Design

Há na obra de Teresa Bravo uma subtil dança entre tradição e inovação, uma perpétua roda que gira em torno da busca da essência da pintura. A exposição “pinctura por pictura” afigura-se assim como uma odisseia etimológica até às origens desta arte onde a representação dá lugar à revelação através de cores vivas e formas intrincadas.

Não nos surpreende, portanto, a riqueza de referências culturais e artísticas nas telas (e respetivos títulos) de Teresa Bravo, fruto da sua mestria e profundo conhecimento de História de Arte. Ainda que esta seja uma pintura que, mais do que intemporal, tem o seu próprio tempo, notamos uma presença muito forte da Antiguidade Clássica no modo como a autora evoca os mitos basilares da cultura ocidental, assentes na dualidade entre criação e destruição, caos e ordem, realidade e sonho.    

A técnica artística de Teresa Bravo, apurada ao longo de vários anos, inverte o processo pictórico convencional ao partir da obra para o esboço, ou seja, parte da pinctura para fazer pictura. O seu processo criativo conduz-nos assim a uma viagem pelas paisagens poéticas que emergem da profusão de figuras nos seus quadros que, à semelhança de Proteu, têm a capacidade de se metamorfosear, fazendo ver o invisível ao sussurrar histórias cujos fios se entrelaçam numa complexa teia policromática.

Neste sentido, subtil é também a dança entre poesia e pintura, uma dança percetível não só no movimento das misteriosas figuras que pairam sobre um fundo monocromático, cuja ausência de profundidade delineia um universo infinito, mas também na complexidade dos títulos das telas, onde a personificação da cor surge aliada a uma vertente mítica e onírica. Expressivos de uma realidade específica que poderá, ou não, corresponder à realidade da pintura que nomeiam, estes títulos fazem-nos questionar a ligação entre ambos: será o título uma súmula da tela ao dar corpo verbal às suas cores e figuras ambíguas – umas vezes claramente antropomórficas, outras obscuras e híbridas? Apontará o título para uma narrativa marginal, talvez até mesmo inexistente, na tela que nomeia, ou acrescentará ele uma outra camada narrativa e significativa?  

Por ser arte que é, efetivamente, arte, a obra de Teresa Bravo não desvenda este nem outros mistérios, antes os alimenta a cada nova observação graças à sua riqueza pictórica, oferecendo-nos uma experiência visual que descarta qualquer tipo de análise imediata ou linear.